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A Propósito da Ucrânia e Israel

  • Foto do escritor: Luis Manuel Silva
    Luis Manuel Silva
  • 19 de fev.
  • 4 min de leitura

Texto do meu livro “Um Comboio de vidas suspensas”

Portugal teve três frentes de guerra em África. Os movimentos de libertação de então, terroristas, apesar dos problemas que têm, são nações livres. Por trás dessa guerra, estavam duas potestades. As mesmas que promovem as guerras assassinas de hoje.


Mapa Geopolítico
Mapa Geopolítico


Para obter vantagens no terreno, intensificou a guerra no Vietname e acabou por se envolver com bombardeamentos sistemáticos no Laos e Camboja. Estava-se num impasse. Nixon, face ao crescimento dos protestos nos Estados Unidos, procurava recuar com honra. No entanto, o rumo da guerra parecia ter-se descontrolado entre soviéticos e americanos. Entre vietnamitas do Norte e do Sul também, se bem que pouco contassem para o seu desenlace. Era uma guerra de secessão fratricida, apoiada por dois gigantes antagónicos, de continentes diferentes. A guerra entre vietnamitas era o pretexto para soviéticos e americanos medirem forças fora de portas. Testavam assim o dispositivo militar, o material de guerra, o poder de fogo, a capacidade de resposta, a rapidez na ação, sem que se sujeitassem, principalmente os americanos, à devassa do território e à opinião pública, cada vez mais ativa. A opinião pública soviética não existia: era cega e manipulada. A União Soviética dizia que era a vontade do proletariado que os empurrava para a libertação dos povos oprimidos. No entanto, proletários e camponeses recalcitrantes, falava-se de milhões, viviam amordaçados e morriam em campos de trabalho forçado, reeducados, espalhados pelos desertos frios da longínqua Ásia Russa. Havia quem lhes chamasse gulags: uma imaginação reacionária do Ocidente capitalista e opressor, no dizer da solidariedade proletária abastada do Kremlin. Entretanto, as manifestações antiguerra do Vietname sucediam-se nos Estados Unidos. Até a Europa se manifestava contra. A sensação que se tinha, e que pairava um pouco pela cabeça dos milicianos, era que o futuro da guerra nas províncias estava intimamente ligado ao futuro da guerra do Vietname. Adivinhava-se, pelo menos para aqueles que tinham acesso a alguma informação, e das conversas em família que o Marcelo deixava escapar, o suficiente para se perceber que alguma coisa estaria para acontecer nos próximos anos. Havia a noção de que os próximos cinco a dez anos iriam ser decisivos, primeiro no Vietname, depois nos Estados Unidos, por arrasto Portugal. Apesar do trauma do Vietname, os americanos não abdicavam da sua condição de força de intervenção internacional.

Enquanto soviéticos e americanos testavam o braço de ferro, Portugal ia colocando em prática a sua estratégia em várias frentes de batalha. Um esforço demasiado grande para a dimensão microscópica do país. Era uma guerra votada ao fracasso devido à sangria dos melhores: a Pátria morria e despovoava-se.

— Olha lá, tens andado a dormir, ou quê? As guerras dependem sempre das potências do momento.

— Depois da Segunda Guerra Mundial, quem manda são os Estados Unidos e a União Soviética.

— Eles é que são os senhores da guerra.

— E levam-na a todo o mundo para proteger os seus interesses, criar novos.

— Parece que estamos na Idade Média.

— A Idade Média acabou, mas o espírito da guerra é o mesmo: agora não se trata de guerras entre reis, é ao nível das nações, muito mais sofisticada.

— Neste caso, nações com uma grande dimensão territorial.

— E a Inglaterra e a França onde ficam no meio de tudo isto?

— Não contam para nada para a configuração do mundo.

— Achas que não?

— Só como aliados estratégicos.

— Porquê estratégicos?

— Foram potências colonizadoras, como nós ainda somos, têm relações com os antigos territórios, conhecem o terreno, falam a mesma língua, são parceiros que não podem ser desprezados face a uma estratégia militar de proteção comercial mais alargada.

— Então a nossa guerra de estimação...

— Depende de americanos e soviéticos.

— Ao longo da História, as zonas de influência estratégica tiveram sempre a ver com o acesso a matérias-primas, rotas de comércio e por aí fora.

— E estiveram sempre condicionadas pelas potências militares do momento.

— Isso é verdade: gregos, romanos, o Sacro Império, Veneza e por aí fora.

— Até nós já fomos uma potência estratégica na Europa, África, América e Ásia. Depois de nós vieram castelhanos, holandeses, franceses, ingleses...

— Agora temos soviéticos e americanos como os senhores da guerra, repartindo entre si, a ferro e fogo, fatias de globo.

— São eles que dizem onde, como e quando se faz a guerra; são eles que definem os parceiros estratégicos, as formas de cooperação.

— Se não quiserem ser parceiros estratégicos nem cooperantes a bem, são-no a mal.

— Como não fazem a guerra diretamente nos seus países, fazem-na indiretamente.

— Exportam-na para fora dos seus territórios e vão enriquecendo à custa dela: venda e consumo de material de guerra; exploração de matérias-primas; colocação de tropas no terreno em áreas estratégicas para controlo de rotas do mar e produtos; criação de países satélites compulsivamente comprometidos com uma determinada ideologia.


Livro
Livro

Esta reflexão sobre a geopolítica e as guerras é um excerto do meu livro "Um Comboio de Vidas Suspensas". Para ler mais, clique aqui para comprar na Amazon.


 
 
 

1 Comment

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makenej573
Feb 20
Rated 5 out of 5 stars.

Gostei bastante deste texto retirado do seu livro. São tempos que não diferem muito dos atuais.

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